NOVO MANIFESTO PELA FEDERALIZAÇÃO DOS CRIMES DE MAIO, E FIM DA "RESISTÊNCIA SEGUIDA DE MORTE"

sábado, novembro 19, 2011

Corte Interamericana analisa Crimes de Maio

do jornal A TRIBUNA , Sábado 19 novembro de 2011

http://www.atribuna.com.br


EDUARDO BRANDÃO
DA REDAÇÃO

A ferida aberta ainda sangra, apesar dos anos. E o sentimento de perda só é superado pelo apelo por Justiça. Sem que se vislumbrem apurações do caso em solo brasileiro, uma corte internacional poderá analisar os assassinatos ocorridos em resposta à onda de ataques do Primeiro Comando da Capital (PCC), em 2006, os chamados Crimes de Maio.

A possibilidade dos casos serem levados à Corte Interamericana de Direitos Humanos foi defendida, ontem, em audiência pública para discutir a série de assassinatos no fatídico maio de 2006. A proposta teve no ouvidor nacional dos Direitos Humanos, Domingos Sávio Dresch da Silveira, seu principal porta-voz. "A Secretaria Nacional de Direitos Humanos (Sedh) da Presidência da República enxerga que estes episódios ocorrem sistematicamente na Baixada Santista", destaca Silveira. "Não são situações banais. Caracterizam chacinas e uma violação dos direitos humanos". A análise dos crimes na corte sediada em San José, capital da Costa Rica, é mais um passo de familiares das vítimas em busca de Justiça. Em instância estadual, os processos foram encerrados sem se apontar os culpados.

Familiares das vítimas alegam que faltam esclarecimentos. "O Ministério Público (do Estado) afirma não ter provas materiais. Mas sabemos que os inquéritos foram encerrados ainda nas delegacias, com falhas e sem respostas para as famílias", afirma Débora Maria da Silva, coordenadora do Movimento Mães de Maio.

Entre 12 e 20 de maio daquele ano, 493 pessoas foram mortas por armas de fogo, segundo levantamento do Conselho Nacional de Medicina. A organização criminosa é responsabilizada pela execução de 43 policiais militares e civis. Segundo a ONG Justiça Global, a onda de ataque do PCC encerrou-se em 15 de maio de 2006. A partir de então, houve um revide da polícia paulista. As investidas são apontadas como a maior crise da segurança pública estadual. Conforme documento elaborado pela ONG, 122 homicídios daquela época tinham indícios de execução e teriam sido praticado por policiais militares.

UMA VITÓRIA
A família de Débora é uma das que foram vítimas da truculência do Estado. Seu filho, o gari Edson Rogério dos Santos, foi assassinado em maio de2006. No mês passado, a primeira vitória do movimento do qual é coordenadora. A 7ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu que o Estado errou na reação. Com isso, Débora vai receber uma indenização de R$ 165,5 mil e pensão vitalícia de um terço do salário mínimo pela morte do filho. Em sua decisão, o desembargador Magalhães Coelho, relator do processo, afirmou que o homicídio decorreu da "conduta descontrolada da polícia". "Temos cautela, mas a decisão gera jurisprudência", acrescenta Débora. Ainda cabe recurso da decisão, em Brasília.

FEDERALIZAÇÃO
A entidade, criada por mães que tiveram filhos mortos por grupos de extermínio, luta pela federalização dos crimes, ou seja, a transferência dos processos da instância estadual para a esfera federal. A transferência de competência também é defendida pelo ouvidor nacional. Em maio passado, a Sedh pediu ao Palácio dos Bandeirantes a federalização dos crimes, mas não houve posicionamento. A Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, da Assembleia de São Paulo, também defende a transferência. "Caso a justiça brasileira não seja apta a julgar os casos, que cortes internacionais o faça", argumenta o deputado estadual Adriano Diogo (PT), que preside o colegiado.


Débora, mãe de um dos executados, quer transferência dos processos


"Foram atos cometidos contra pobres e negros"


ENTREVISTA

Domingos Dresch da Silveira
Ouvidor Nacional dos Direitos Humanos

A inércia da Justiça Nacional sobre o caso faz com que a luta das Mães de Maio não chegue ao fim. Porém, um novo capítulo para aliviar a dor de quem viu seu filho partir pode se dar com a análise dos crimes pela Corte Interamericana. Esta é a defesa do ouvidor nacional.


Como a Ouvidoria Nacional analisa os Crimes de Maio?
O que já aparece de uma forma muito clara para a Secretaria de Direitos Humanos é que esta situação não foi pontual, corriqueira ou isolada. É uma prática sistemática e parte da omissão e ou ineficiência do Estado em apurar e punir.


E o que isso acarreta?
Isso configura uma grave violação dos Direitos Humanos. Além disso, uma fraqueza e omissão do estado em punir. E, como consequência destas situações, pedimos a federalização dos crimes. A ouvidoria defende que estes fatos sejam levados à Corte Interamericana de Direitos Humanos. O que ocorreu é uma grave violação cometida e patrocinada por grupos de extermínio, que têm uma atuação extremamente seletiva: buscam pobre e negros. Portanto, é preciso que a Corte Interamericana possa conhecer estes fatos para verificar se há incompatibilidade com a convenção americana de Direitos Humanos.


Como se dará a ida do processo à essa Corte?
Quem promove a ida à Corte são as vítimas. Esta ação não é papel do Estado (representado pela União). Como ouvidor, tenho o dever de dizer a estas mulheres que enxergamos nos episódios de 2006, que se repetiram em 2010, e voltaram a acontecer e ocorrem sistematicamente, que não são situações quaisquer, não são banais. Elas caracterizam chacinas e uma violenta violação dos direitos humanos.

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